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1 de novembro de 2017

Mártires no império (VIII)




3.9. Os mártires de Alexandria durante a perseguição de Décio (249-251) De uma carta de São Dionísio a Fábio, bispo de Antioquia, trazida por Eusébio de Cesaréia na História Eclesiástica, l. VI, c. 40,1-42,6. "A perseguição, entre nós, não teve início com o edito imperial, mas foi retardada de um ano, até quando chegou a esta cidade um adivinhador e tecelão de erros, quem quer que fosse, provocando e excitando contra nós a multidão dos gentios, atiçando outra vez a sua superstição congenial. Excitados por ele e levados a tirar da licenciosidade desenfreada todo gênero de impiedade, consideravam assassinar-nos como o único ato de devoção e culto que lhes era devido.

A primeira vítima foi um velho chamado Metras, que capturaram e tentaram obrigar a blasfemar; como ele não se rendesse a suas imposições, bateram nele e atravessaram seu rosto e olhos com bambus aguçados, levando-o depois à periferia da cidade onde delapidaram-no.

Uma mulher chamada Quinta foi levada até diante do altar dos ídolos, onde os pagãos tentaram obrigá-la a um ato de adoração: tão logo ela retesou o corpo com profunda sensação de desgosto, foi amarrada e arrastada pelos pés através da cidade, fazendo com que batesse contra as grandes pedras do duro calçamento. Levando-a ao mesmo lugar suburbano, delapidaram-na.

Depois disso os pagãos lançaram-se juntos sobre as casas dos cristãos e, irrompendo nas residências que cada um sabia pertencer aos próprios vizinhos, cumpriram toda sorte de roubos e saques. Separavam cuidadosamente os objetos mais preciosos, e jogavam das janelas e queimavam pelas ruas os mais rudes e os que eram feitos de madeira.

O espetáculo apresentado parecia o de uma cidade tomada pelos inimigos. Os irmãos procuravam fugir e esconder-se, e acolheram com alegria também o saque de seus bens, semelhantes àqueles dos quais deram testemunho o apóstolo Paulo (Hb 10,34). Não sei se houve naquela circunstância, alguém que renegasse a Cristo, a menos que se tratasse de uma pessoa caída nas garras dos adversários.

Outra nobilíssima vítima foi a anciã Apolônia: os pagãos prenderam-na, fizeram arrancar todos os seus dentes, com murros dados nas faces e, depois, acesa uma fogueira diante da cidade, ameaçaram queimá-la viva caso não pronunciasse com eles as palavras ímpias, que eram a mensagem da blasfêmia pagã. A mulher, porém, depois de ter pedido vivamente que lhe deixassem à disposição um breve tempo, tão logo viu-se livre saltou sobre o fogo e foi queimada.

Serapião foi preso em casa: submeteram-no a duros tormentos, quebraram-lhe os ossos e finalmente lançaram-no de cabeça do andar superior. Não se podia percorrer nenhuma rua, larga ou estreita, de noite ou de dia, sem ouvir sempre e em todos os lugares as gritarias da multidão e, se alguém não entoava em coro com eles as palavras ímpias, era arrastado e queimado vivo.

A perseguição continuou por muito tempo nesse tom de violência, até quando a sedição e a guerra civil, que sucederam às desventuras anteriores, não levaram os pagãos a voltar-se reciprocamente a crueldade que antes tinham dirigido sobre nós.

Vivemos tranqüilos por algum tempo, durante a trégua que os pagãos tinham feito ao ódio contra nós, mas bem logo foi-nos anunciada a notícia da mudança do poder imperial, antes muito benévolo, e reacendeu-se com a máxima intensidade o terror de uma nova ameaça contra a nossa comunidade.

Foi promulgado o edito, talvez o mais terrível de todos os que nosso Senhor tinha predito, a ponto de escandalizar, se for possível, também os eleitos. É certo que todos ficaram arrasados. Entre as pessoas mais conhecidas na cidade alguns, por medo, aderiram às ordens do edito, outros, que cobriam encargos públicos, foram levados a obedecer ao edito da sua própria posição, outros ainda foram arrancados à vida familiar.

Chamados pelos nomes, alguns apresentavam-se pálidos e trementes diante dos sacrifícios ímpios e sacrílegos, como se não fossem sacrificar, mas fossem eles próprios as vítimas destinadas aos ídolos; entretanto a multidão girava ao redor dos altares pagãos fazendo burla sobre eles, porque mostravam claramente estar com medo, tanto da morte como do sacrifício.

Outros, porém, corriam intrépidos aos altares, declarando com desfaçatez que não eram cristãos e nem sequer o tinham sido no passado. Será verdade para eles a predição do senhor, que dificilmente se salvarão.

Dos restantes, houve quem agregou-se ao primeiro grupo, quem ao segundo, enquanto outros fugiram. Entre os que foram presos, uma parte resistiu ao cárcere e às correntes em que foram mantidos por muitos dias, mas depois abjuraram, antes de se apresentarem ao tribunal; outra parte suportou os tormentos também por um certo tempo, mas acabaram abjurando também eles.

Outros cristãos, entretanto, colunas sólidas e prósperas do Senhor, corroborados pela sua graça, tiraram a constância e a energia da fé que os inspirava tornando-se, assim, testemunhas admiráveis do seu reino.



Organizado e publicado por:
Domingos Teixeira Costa