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28 de abril de 2007

Mãe diz que família estava no ‘lugar errado, na hora errada’

Campinas

Durante quase uma hora de entrevista que a atendente Mara de Souza, de 29 anos, deu na tarde de ontem, em Campinas, ela ainda estava com a calma que ajudou a manter os filhos Vítor, de 10 anos, Thiago de 7, e Murilo, de 4, tranqüilos nos momentos em que ficaram sob a mira de Gleison Flávio de Salles, de 23 anos. “Ele não escolheu entrar lá. A gente estava no lugar errado, na hora errada. Eu sinto raiva, mas ao mesmo tempo eu agradeço por ele não ter feito nada para os meus filhos”, disse Mara.

Ela e dois dos três meninos foram libertados após 56 horas da maior negociação com reféns registrada no Estado. O seqüestro terminou anteontem, às 20 horas, quando o Grupo de Ações Táticas e Especiais (Gate) invadiu a residência da família após ouvir um disparo feito por Salles. Esse foi o momento mais difícil, segundo Mara, de todos os decorridos dentro do mesmo quarto da casa 1.053 da Rua Canêo Pompeu de Camargo, no Jardim Novo Campos Elísios, periferia da cidade.

Vitor tinha sido entregue pelo seqüestrador à polícia, graças à intervenção de uma amiga, Gislaine Cristina Domingos, que se prontificou a participar das negociações. Mara e Thiago seriam libertados também. Mas quando a polícia devolveu a energia elétrica à casa e Salles viu pela televisão que o nome dele era divulgado ficou irritado.

“Ele abriu a janela, deu um tiro pra fora. Ligou o gás e deitou com meu filho no chão”, disse a atendente, chorando. O homem armado usou a criança como escudo, com a arma apontada para a cabeça do menino, e ainda pediu para Mara deitar sobre eles. “Se eu visse que ele ia puxar o gatilho, eu ia puxar a arma para a minha cabeça. Se ele matasse meu filho, teria de matar a nós dois”, afirmou.

A intenção do seqüestrador não era, porém, matar os reféns, afirmou a atendente. “Ele não nos maltratou. Só queria fugir, não queria voltar para a cadeia.” Salles tem passagem pela polícia por quatro tentativas de homicídio e porte de armas e estava foragido desde 2005. O rapaz saiu ferido.

INVASÃO

O seqüestro começou na terça-feira, dia 24. Mãe e três filhos almoçavam quando, por volta de meio-dia, ouviram barulhos. Eram os tiros que Salles trocou com um policial à paisana, na casa de um vizinho. “Saí pela porta da sala, numa varanda alta, para ver o que era. Quando vi, ele estava dentro de casa. O mais velho (Vítor) correu para debaixo da cama. Ele ficou com a arma apontada para o Thiago e o Murilo. Uma vizinha deu dois telefonemas para eu fechar a casa, mas ele já estava lá”, afirmou Mara. O filho caçula, Murilo, foi libertado na terça-feira mesmo, em troca de um colete à prova de balas. “Agradeci muito. O Murilo não ia ter paciência para ficar ali”, afirmou a mãe.

Mara e os três filhos ficaram no quarto dos três meninos durante quase todo o tempo. Ficaram sem energia elétrica, mas, na segunda noite, Salles permitiu que Mara fosse até a cozinha pegar água e ela voltou com velas, também permitidas. Mãe e filhos alimentaram-se, basicamente, de biscoitos e água. Urinaram em garrafinhas de plástico ou nas roupas no primeiro dia. “Uma noite, não me lembro porque perdi a noção do tempo, Thiago pediu para comer Sucrilhos. Ele deixou”, disse a mãe. Aos poucos, Salles foi cedendo. Nos momentos de ira, Salles usava o botijão de gás e a arma para ameaçar as crianças. “Mas ele dizia que não ia fazer nada, só ameaçava para tentar coagir a polícia.

”Mara afirma que o seqüestrador criou um certo vínculo com as crianças. “É estranho, mas foi como se fosse uma certa amizade.” O homem, que tinha passagem pela polícia por quatro mortes, brincou com as crianças de jogo-da-velha, deu conselhos, conversou com os meninos e contou muita coisa da própria vida. “Ele dava conselhos, bons conselhos, para não seguirem o caminho do mal, não responderem para os pais”, afirmou Mara.

Jornalista: Gazeta de Limeira

{Costa}

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